sexta-feira, 6 de outubro de 2017

"O show será como uma festa. Quero que todos se divirtam", diz Paul McCartney

Paul McCartney é um gigante forjado no talento musical e no rigor profissional. São dois de seus múltiplos atributos combinados no combustível que o mantém firme e forte na estrada. Aos 75 anos, este artista incomum roda o mundo com um espetáculo de três horas de duração, compõe novas canções, grava com artistas de novas gerações e zela pelo valioso patrimônio universal que ergueu com os Beatles. Foi nesse pique que Sir Paul conversou com GaúchaZH no último dia 26, em meio à maratona de nove shows que cumpria na região de Nova York – a perna norte-americana da sua One on One Tour foi encerrada terça-feira, em Detroit. Sua oitava passagem pelo Brasil terá início em Porto Alegre, no próximo dia 13, e segue para São Paulo, Belo Horizonte e Salvador.
O rigor profissional do músico se mostra não apenas na disposição de continuar fazendo de cada espetáculo  uma experiência memorável para os fãs. Estende-se a detalhes como a atenção que dedica aos seus entrevistadores das mais variadas procedências. Na véspera do dia marcado para o bate-papo de 15 minutos com GaúchaZH, Stuart Bell, responsável por tudo que envolve o relacionamento de Paul com a imprensa, ligou para o repórter confirmando o horário (entre 16h e 18h), avisar que mandaria material com dados estatísticos da turnê, trocar impressões sobre o show do músico em 2010 no mesmo palco, o Estádio Beira-Rio, entre outras amenidades.
No dia seguinte, exatamente às 16h, Mark, assessor pessoal de Paul, liga para o estúdio da Rádio Gaúcha, onde a entrevista seria gravada, e avisa que Paul deve ligar em uma hora – logo mais à noite ele se apresentaria no Nassau Veterans Memorial Coliseum,  em Uniondale, subúrbio de Nova York. Uma hora depois, bingo:
– Olá, Marcelo. É Paul.
Em respostas curtas, como se buscasse otimizar o tempo restrito de conversa, o gigante falou, entre outros temas, sobre o repertório da gira mundial iniciada em abril de 2016, na qual decidiu celebrar, como nunca antes, seu glorioso passado – cerca de 70% das 39 canções dos shows são dos Beatles, incluindo hits que ele nunca havia tocado em sua carreira solo. Também falou sobre a recente parceria com Kanye West e Rihanna, dos músicos de sua baita banda (com a qual está há mais tempo do que passou com John, George e Ringo), do próximo disco e de como andam as suas aulas de português.
Chama a atenção em suas declarações – no mesmo tom empolgado, aliás, das que fazia no auge da beatlemania – o respeito que tem por quem se dispõe a comprar o ingresso. O público, para Paul, está em primeiro lugar, e a energia sobre o palco, dele e de seus músicos, nunca pode ser menos do que a máxima.
Leia a seguir a conversa, que acabou durando quase 18 minutos, nos quais Sir Paul demonstrou polidez e bom humor. Algumas perguntas da lista não puderam ser feitas no correr do cronômetro, outras acabaram sacrificadas por seu deslocamento no rumo da conversa. Nada de impaciência ou de assessor alertando o tempo excedido, como é comum encarar em entrevistas com astros e estrelas de grandeza infinitamente inferior à desse gigante.
Desde o show de 2010, em Porto Alegre, você lançou novos discos, novos projetos relacionados aos Beatles, trabalhou com artistas como Kanye West, Rihanna e Foo Fighters, George Martin morreu, você veio outras vezes ao Brasil... De que forma isso tudo se reflete na nova turnê?
Não gosto de falar sobre as coisas que planejo fazer. Porque, na era da internet, são tão poucas as surpresas. As pessoas que pesquisam na internet já sabem o que canto nos shows. Então, procuro sempre apresentar algumas surpresas nos shows, e assim será em Porto Alegre. Espero que você me ajude a deixar que as pessoas possam ser surpreendidas (risos).
Nesta turnê, você toca pela primeira vez em sua carreira solo clássicos do Beatles como A Hard Day’s Night e Can’t Buy me Love, e também In Spite of All the Danger, uma das primeiras músicas que gravou, com os Quarrymen, em 1958. Qual a sensação ao ver a reação do público a essas canções, em especial os fãs mais jovens?
É muito bom. Escolhemos essas canções porque gostamos delas. Quando as ensaiamos, se elas soam bem, nós as colocamos no show. A reação tem sido realmente boa. É bom para nós, porque não as havíamos tocado antes, e também para o público, até mesmo para as pessoas que já nos viram e agora vão encontrar algo diferente. A reação (do público) tem sido incrível.
Entre tantas canções, escolher quais tocar a cada show é divertido ou prazerosamente doloroso?
É prazeroso. Algumas das canções que tocamos são tecnicamente mais difíceis de apresentar do que outras. Mas, se não fosse prazeroso, não as tocaríamos. Sempre experimentamos apresentá-las para o público porque, se gostamos delas e as colocamos no repertório, acabam se tornando especiais para a plateia, que também se diverte com elas. Então, é sempre um prazer tocar essa canções. Muito porque o público pode viver uma experiência grandiosa, calorosa e amigável. E é isso que torna os shows tão especiais.
É verdade que você prepara uma música nova para apresentar nessa nova passagem pelo Brasil? O que pode nos adiantar sobre ela?
Andei falando sobre isso com alguém outro dia, mas é para o meu próximo disco, e não para os shows. Tenho uma canção que tem a ver com o Brasil que será incluída no meu novo disco, então, espero que essa nova canção fique boa e entre no álbum. Mas não a apresentarei no show.
E em que fase está a preparação desse disco? Como funciona seu processo de composição em meio a uma turnê?
Tenho composto canções e, quando as tiver em quantidade suficiente, entrarei no estúdio de gravação para dar a largada a um novo álbum. Já comecei esse processo, tenho cerca de três quartos do material. Gravo algumas canções e vejo quais podem se tornar as melhores. Provavelmente esse álbum será lançado em algum momento do ano que vem. 
Você está tocando com Rusty Anderson, Brian Ray, Abe Laboriel e Paul Wickens há 15 anos. De que forma eles contribuem para a evolução de seu trabalho no estúdio e no palco?
(Eles contribuem) Especialmente no palco. São como minha família: a minha família de palco. Como você disse, tocamos juntos já há muito tempo. Não sabemos o que vai acontecer; sabemos o que temos de fazer. Se ocorre algum erro, sabemos que não devemos nos preocupar tanto, ninguém vai levar aquilo a sério demais, vamos rir. Às vezes, se cometemos algum erro, dizemos ao público: "Ei, isso prova que estamos tocando ao vivo". São rapazes ótimos, e estamos nos divertindo há muitos anos. Gostamos de tocar juntos, são músicos muito bons. Nos divertimos e o público também. Não precisamos de nada mais.
Abe Laboriel é um grande performer.
Sim. Ele é um baterista muito bom e um cara muito legal.
Em seu show anterior em Porto Alegre, você não tocou Maybe I’m Amazed, canção que muitos de seus fãs amam. Eles ficarão felizes agora?
Espero que sim. Não sei exatamente o que vou tocar em Porto Alegre, mas espero tocar essa canção.
O que achou da experiência de trabalhar com Rihanna, Kanye West e outros novos talentos da música pop? De alguma forma, eles seguem um caminho que você ajudou a abrir. Deve ser razão de orgulho, não?
É muito bom trabalhar com pessoas com quem eu não costumava trabalhar antes, como Kanye, que é do hip hop, e eu ainda não tinha trabalhado com ninguém desse gênero. É interessante ver como ele produz seus discos, de um jeito muito diferente do meu. Ele reúne muitas informações e as combina em uma faixa. É como se estivesse fazendo a curadoria de uma exposição de arte. Fizemos juntos uma música, FourFiveSeconds. Acho que o resultado ficou muito bom. E, quando fomos tocar juntos no (prêmio) Grammy, tive a oportunidade de trabalhar com Rihanna. Ela também é uma artista incrível, uma grande performer e uma pessoa muito agradável. Essas parcerias mantêm as coisas interessantes, estimulantes e revigorantes. Gosto disso.
No dia último dia 26 completaram-se 48 anos do lançamento de Abbey Road. Na turnê, você toca, desse disco, Something, The End e Golden Slumbers. Quais as suas lembranças desse álbum?
É um bom disco dos Beatles. Foi um álbum bom de fazer, tal era força criativa de trabalhar com John, George e Ringo. Foi emocionante, às vezes difícil, noutras fácil, com um nível de energia criativa muito grande. Tenho lembranças de ficar agrupando as seções do segundo lado, pegando fragmentos para formar um medley.
Brian Wilson fez uma turnê para celebrar os 50 anos de Pet Sounds (disco clássico dos Beach Boys que foi assumida referência na produção de Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band, dos Beatles). Vocês não pensou em fazer algo parecido para celebrar os 50 anos de Sgt. Pepper's?
Nós tocamos canções do disco no show, e é tudo que fazemos. Na verdade, não costumo me envolver muito com grandes movimentos como esses. Não costumo ficar contando o tempo, são as outras pessoas que falam comigo sobre esses 50 anos. Claro que é legal saber disso e é difícil acreditar no quão impressionante soa ter sido há tanto tempo. Mas nós não pensamos em tocar o álbum inteiro ou algo desse tipo. Apenas algumas canções.
Um de seus dois shows no Estádio Maracanã, em 1990, entrou para o Guinness com 184 mil espectadores no total. Desde então, você já veio muitas vezes ao Brasil. O que mais lhe chama a atenção no público brasileiro?
O entusiasmo. Eu amo países que são tão musicais e amam tanto a música. E o Brasil é um desses países: tem pessoas especiais que gostam de dançar, de cantar e de curtir a música. O Brasil tem o tipo perfeito de plateia para nós, o tipo de que gostamos. Porque penso que nosso show é e será como uma festa: quero que todos que aparecerem se divirtam. O público brasileiro é muito bom nisso: vai para se divertir. Isso é ótimo para nós, porque quando vemos pessoas se divertindo nos sentimos muito bem no palco.
Qual é a sua opinião sobre a atual tensão política no mundo, com guerras que provocam milhões de refugiados, manifestações de intolerância racial e religiosa e a política belicosa do presidente norte-americano Donald Trump?
São tempos muitos difíceis, com muitas pessoas fazendo coisas com as quais não concordamos. É um pena que não tenhamos líderes realmente fortes no mundo, que te façam acreditar que vão fazer a coisa certa. Acho que vivemos em uma época que não é fácil, mas acredito que sairemos disso, e aí então as coisas ficarão melhores do que estão. Mas, de fato, não é um momento feliz para muitas pessoas.
De que forma você avalia a transição da indústria musical para as plataformas digitas e como procurou se adaptar a esse processo?
Na verdade, este não é um assunto que me preocupa muito. Sabe, eu atravessei a era do vinil, dos cassetes e do CD e agora do streaming. Acredito que a coisa mais importante é a canção, a música em si – é nisso que me concentro, é esse o meu trabalho. Muitos jovens gostam do vinil, que, na minha opinião, é a melhor maneira de ouvir música, é o que tem o som melhor e mais puro, mas muitos desses garotos escutam música nos seus telefones. Não me importa a forma como cada pessoa vai escutar, o importante é a música.
Você costuma usar serviços como o Spotify?
Sim, escuto novos discos, para saber o que está rolando. Mas não faço isso religiosamente. Acho que tem muita coisa boa por aí.
Como estão suas aulas de português? Em sua outra passagem por Porto Alegre você aprendeu alguma expressões locais.
Ah, vão muito bem. (Falando em português) Obrigado. Gosto de aprender algumas expressões locais quando vou ao Brasil... (De volta ao português) Brasil. Minha gatinha linda. É legal quando as pessoas me explicam alguns termos locais.
Por favor, mande uma mensagem para seus fãs, que no sul do Brasil são chamados gaúchos.
Gaúchos? Ei, saudações a todos os gaúchos. Estamos chegando ao Brasil, vamos viver grandes momentos, venham nos ver e vamos fazer uma festa juntos. Com muito amor, Paul.

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