Leia abaixo um trecho da reportagem de capa da edição 91 da Rolling Stone Brasil , abril/2014. A revista chega às bancas de São Paulo e Rio de Janeiro no dia 14/4, e na semana seguinte aos demais estados.
John Lennon permaneceu em silêncio
enquanto o voo prosseguia para os Estados Unidos. Paul McCartney – que
disse ter acreditado no sucesso dos Beatles desde o momento em que o
single de estreia da banda, “Love Me Do”, apareceu pela primeira vez nas
paradas britânicas – também tinha suas desconfianças, embora negasse.
Era 7 de fevereiro de 1964, e poucas horas antes os Beatles haviam
deixado a Inglaterra para trás, rumo às primeiras apresentações do grupo
em solo norte-americano, que iriam incluir a estreia na TV dos Estados
Unidos, no popular programa de Ed Sullivan transmitido nos domingos à
noite. No dia 17 de janeiro, enquanto se apresentavam por duas semanas
em Paris, Lennon e McCartney, junto a George Harrison e Ringo Starr,
estavam no quarto de hotel depois de um dos shows quando o empresário
Brian Epstein disse que havia recebido um telegrama da Capitol Records: o
single “I Want to Hold Your Hand” havia acabado de chegar à posição
número 1. “Eles emudeceram. Ficaram sentados aos pés de Brian como se
fossem gatinhos”, disse o fotógrafo Dezo Hoffman. O arranjador e
produtor Quincy Jones também estava presente em Paris, e ele, Epstein e
McCartney apostaram que os Beatles dominariam a América. Lennon,
Harrison e Starr apostaram contra o sucesso da banda. Em setembro de
1963, Harrison visitou a irmã dele, Louise, em Benton (Illinois). “Eles
não nos conhecem”, o guitarrista contou aos companheiros quando voltou à
Inglaterra, falando sobre o mercado dos Estados Unidos. “Não vai ser
fácil.”
Agora, com os Beatles rumando para o outro lado do Atlântico, “I Want to Hold Your Hand” e o primeiro álbum deles pela Capitol, Meet the Beatles!,
iriam liderar a parada norte-americana em 15 de fevereiro. Lennon,
Harrison, McCartney e Starr estavam inquietos no avião, conversando com
amigos e parceiros, incluindo Epstein e o produtor Phil Spector. “Os
Estados Unidos sempre tiveram tudo”, McCartney disse a Spector. “Por que
deveríamos ir até lá tentar ganhar dinheiro? Eles têm as bandas deles. O
que podemos dar que eles já não têm?” Lennon, sentado com a esposa,
Cynthia, era um misto de ansiedade e arrogância. “Durante o vôo eu
pensava: ‘Oh, não vamos conseguir’... Mas eu sou assim mesmo”, ele
contou posteriormente a Jann S. Wenner, publisher da Rolling Stone. “Sabíamos que íamos arrasar se tivéssemos a chance.”
Quando o avião pousou no Aeroporto Internacional John F. Kennedy, em
Nova York, o piloto avisou ao grupo que havia fãs à espera. Os Beatles
estavam acostumados a multidões. Na Grã-Bretanha, jovens apareciam nos
shows berrando. Mesmo assim, conforme a aeronave se aproximava do
portão, quem estava a bordo ficou confuso com o som ensurdecedor vindo
de fora. Quando os Beatles desembarcaram, McCartney viu o tumulto e
perguntou: “Isso aí é por causa de quem?” Os quatro pararam na escada
que levava à pista e contemplaram a vista – 4 mil jovens em êxtase
acenando, levantando cartazes de boas-vindas, enquanto a polícia fazia
um cordão de isolamento para conter o tumulto. Elvis Presley havia
demonstrado como utilizar a rebeldia como instrumento de mudança; os
Beatles incitariam algo ainda mais forte na juventude – algo que começou
como um consenso, uma alegria compartilhada, mas que com o tempo se
transformaria em uma relação de poder. O impacto do grupo era mais do
que uma simples moda passageira ou efeito da celebridade; se tratava
mais de se apossar de uma postura jovem que era completamente nova.
No momento em que Brian Epstein – um dono de lojas de discos de
Liverpool que ansiava por uma vida um pouco mais relevante – tornou-se
empresário do grupo, fez questão de tirar todo o ar punk dos Beatles.
Mas ele não privou o quarteto de sua alma e instinto musical, e a fé
dele logo deu resultados. No fim de 1962, os Beatles ainda eram uma
banda desconhecida e promissora, que, sob os cuidados de Epstein e o
instinto afiado do produtor George Martin, havia acabado de entrar no
Top 20 britânico com “Love Me Do”. Era uma faixa contagiante, mas
monótona; Lennon e McCartney ainda não haviam aflorado como
compositores. Isso mudou rápido. Canções seguintes como “Please Please
Me” e “She Loves You” eram audaciosas, cheias de momentos criativos e
alucinados. Lennon e McCartney se basearam em sons que haviam ouvido a
vida toda – incluindo canções do teatro britânico, baladas de
espetáculos musicais, country, letras de duplo sentido, R&B e blues.
A dupla de compositores alternava momentos de angústia e esperança, em
acordes maiores e menores, de modo a soarem empolgantes ou evocativas.
E então tínhamos os próprios Beatles. Eles pareciam um grupo de
renegados elegantes, vestidos com ternos mod de corte europeu, e cabelos
longos – franjas penteadas para a frente, a parte de trás roçando os
colarinhos. Tudo na música e na atitude deles transpirava ares de
novidade. No fim de 1963, os Beatles tinham cinco singles no Top 20
britânico, três dos quais chegaram à posição número 1. O álbum de
estreia, Please Please Me, manteve-se no topo por 30 semanas – somente para ser destronado pelo segundo álbum da banda, With the Beatles.
O grupo batia recordes de audiência na televisão, tocava para a família
real (com Lennon polemizando) e ganhava manchetes diárias.
Você continua lendo esta matéria na edição 91 da Rolling Stone Brasil, Abril/2014.
fonte: Rolling Stone Brasil
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